Génese do Modernismo
Surge
no segundo decénio do século XX este movimento artístico que
filosoficamente assenta em Fichte e Hegel. O Simbolismo nascente
de Eugénio de Castro passa e dá lugar ao Neoclassicismo de
Tirésias, depois da Ceifa (...), tal como acontece com Jean
Moréas. O espaço que decorre até ao Modernismo é preenchido
pelo Simbolismo do distante Camilo Pessanha, pelo Saudosismo de
Teixeira de Pascoaes, pelo Nacionalismo e Narcisismo de António
Nobre e pelo Classicismo de António Sardinha. Pessoa e
Sá-Carneiro, que foram saudosistas do grupo de A Águia e da
Renascença Portuguesa, separam-se e vão dar origem ao grupo do
Orpheu com Luís de Montalvor e Ronald de Carvalho. Orpheu entra
abertamente em oposição com o Saudosismo, o Academismo, o
Nacionalismo e o Parnasianismo. Sacode o grande público essa
rajada impetuosa de Decadentismo, de sonho, do inconsciente em
versolibrismo. O Paulismo, o Interseccionismo, o Sensacionismo
«emaranhados imaginativos do grande todo», «Tudo é outra
coisa neste mundo onde tudo se sente» (Álvaro de Campos),
aparecem sucessivamente. É a permissão dada à liberdade
confessional de interioridade que vai orientar os poetas do
Surrealismo. Em Orpheu, o escândalo anuncia-se, prosseguindo em
Centauro, Exílio, Portugal Futurista (1917), Atena (1924), mas
é a Presença (1927) que vai fixar a influência do movimento
que sacudiu mas não se impôs, o que, doze anos mais tarde, se
torna possível, em razão do criticismo equilibrado de João
Gaspar Simões, de José Régio, de Adolfo Casais Monteiro. A
Nouvelle Revue Française vai permitir a esta geração continuar
e aprofundar a semente estuante de seiva lançada em Orpheu.
José Régio apresenta as linhas programáticas do nosso segundo
Modernismo: uma arte renovada, desligada de intenções
religiosas, nacionalistas, filosóficas, voltada para a busca, a
descoberta do mundo interior do homem. André Gide e Paul Valéry
são padrões da estética do movimento. O Modernismo ensaia-se
em 1913 com os poemas Dispersão de Sá-Carneiro e Pauis de
Fernando Pessoa (publicado em Renascença, 1914). Progride com o
encontro de Pessoa e Almada-Negreiros depois da crítica de
Pessoa em Águia a uma exposição de caricaturas daquele. Mário
de Sá-Carneiro e Santa - Rita Pintor com a sua rajada de
Futurismo impulsionam o aparecimento do primeiro número de
Orpheu, que provocou um impacto extraordinário. Orpheu só saiu
duas vezes e os poetas modernistas vão publicando nas revistas
já citadas. Simbolismo - Pauis, Decadentismo, Romantismo -
passado e futuro - aproximam-se, juntam-se. Do Paulismo, Pessoa
passa rapidamente para o Interseccionismo da Chuva Oblíqua e
para o Sensacionismo em busca da tal arte europeia cosmopolita
que visava, como diziam, "épater le bourgeois". A
literatura moderna é apreciada por José Régio, que salienta a
dispersão ou a multiplicidade da personalidade - a heteronímia
em Pessoa e outros desdobramentos em Sá-Carneiro e
Almada-Negreiros, o seu irracionalismo, intelectualismo e "a
expressão paradoxal das emoções e dos sentimentos" que
levará ao Surrealismo.