Podemos dividir este poema em três momentos.
O primeiro é constituído apenas pelo primeiro verso, uma afirmação, sob forma de trilogia:
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Três verbos a marcar duas acções e o efeito dessas acções: da vontade divina e do sonho do homem nasce a obra.
Os três sujeitos (Deus, o homem e a obra), dependentes mutuamente, praticam as suas acções:
O primeiro quer, o segundo sonha e a terceira nasce. Mas, sem a vontade do primeiro, o segundo não sonharia e a terceira não podia nascer.
O segundo momento vai até ao fim da segunda quadra e, subdivide-se em três partes:
A primeira, referente a Deus, vai até Sagrou-te.
A segunda, referente ao homem, vai até ao fim da primeira quadra, onde se desenvolve a ideia de que o homem sonha e é o agente da vontade divina, o qual que é animado por um projecto divino, o Infante.
A terceira, referente à obra, vai até ao fim da segunda quadra e corresponde à revelação:
e viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
O terceiro momento é uma conclusão da glosa e obedece a um esquema semelhante ao do primeiro verso, um esquema dialéctico hegeliano: o sonho cumpriu-se, desfez-se e deu lugar a um novo sonho. O sonho cumprido (cumpriu-se o Mar) corresponde à tese, o sonho desfeito (O Império se desfez) seria a antítese, e o novo sonho a síntese (Cumprir-se Portugal).
O poema é rico em vocabulário de conotação eufórica, positiva luminosa como acontece, na segunda quadraorla brancaclareousurgir redonda do azul. É constituído por uma métrica bastante rigorosa o que faz notar algumas repetições.
e o Império se desfez / falta cumprir-se Portugal, perante esta afirmação tal vocábulo eufórico acaba quando se reflecte sobre o presente e o futuro.
Do ponto de vista simbólico evidenciam-se vários elementos importantes como Mar, Império, clareou, redonda, azul e branco.
Também o Infante surge como o símbolo do homem universal, o herói que realizou um sonho que era a vontade de Deus.
Do ponto de vista estético salientamos a imagem que traduz a comunicação estética deste poema. A expressão a orla branca sugere a forma que a água toma junto ás proas dos navios, quando estes se deslocam, referindo-se ao espaço marítimo conquistado pelos portugueses. A metonímia sagrou-te e foste desvendando a espuma o que aqui de alude é ao mar. A anáfora, a construção anafórica Deus /Deus, E / E que sugere o destino emanado por Deus e o seu cumprimento, numa sucessão temporal, realizada pelo homem.
A nível fónico predominam os sons nasais e fechados (m, n, o), no intuito de ilustração do tom respeitoso, como reconhecimento de uma obra sagrada. No entanto, os sons abertos (a, e) evocam-nos a grandeza da acção dos portugueses, no cumprimento da vontade de Deus.
Posso então concluir com uma interpretação do poema:
1. Nele se sugere a ideia de um ritmo cíclico dependentemente da vontade de Deus, ditado pelo Destino: Deus quis, o homem sonhou, a obra (o Império) nasceu, a obra desfez-se e falta cumprir-se Portugal. Deus tem de querer de novo que se cumpra Portugal.
2.Há ainda a ideia de assimilação do Infante ao homem animado de um projecto de universalidade e imortalidade.
3.Acentua-se a divinização do herói, que é o eleito de Deus, um iniciado
4.A divinização do herói transforma-se na divinização de um povo, que é também um eleito de Deus para levar a cabo uma missão, um projecto ideal de universalidade e de unidade do mundo.
Fig.1 Este esquema mostra-nos a relação e a importância no contexto total do poema destas três palavras maiúsculas, desta trilogia que se situa ao mesmo nível existencial. Se nós pudéssemos fechar o triângulo num circulo, teríamos, então conquistado o 5.º Império, que é o símbolo da perfeição do universo espiritual idealizado por Fernando Pessoa